2006/11/29

O grande circo da Física - a velocidade do chuto do Ronny

Parece que é essa a questão com que se debatem os dois principais diários desportivos. A Bola consultou especialistas, e fala em 120 km/h. Já o Record faz ele próprio o cálculo simples e apresenta o resultado na primeira página: 222 km/h! Poucas vezes a Física do ensino scundário tem honras de primeira página de um jornal.
Dado o curto intervalo de tempo entre o chuto e a bola entrar na baliza, a aproximação que consiste em considerar a sua trajectória rectilínea (e não parabólica, desprezando a influência da gravidade) parece-me razoável. A aproximação para a distância percorrida também não me parece mal de todo, embora pudesse ser melhorada sem dificuldade (aqui o texto está mal: embora a trajectória seja "diagonal", também é "rectilínea").
O que me parece afectar o resultado é mesmo o valor do intervalo de tempo, que o Record apresenta como 28 centésimos de segundo. Não sei o rigor desta medição, mas não deve ser muito alto. Deve ser esta a origem da discrepância entre os valores dos dois jornais. Discrepância que levou A Bola, na edição de hoje, a reiterar a sua estimativa, consultando um especialista. Eu inclino-me mais o valor deste jornal. Se fosse o do Record (cerca do dobro), implicaria uma energia quatro vezes superior, algo nunca registado antes. E eu não acredito que o Ronny tenha uma energia de remate quatro vezes superior à do Roberto Carlos! A matéria de A Bola é mais completa, apresentando uma discussão comparativa. Mas a do Record apresenta números, embora se limite a fazer um cálculo elementar. Qual é que vocês preferem?
Fica entretanto a lição - os jornalistas devem consultar os especialistas, principalmente antes de fazerem manchetes de primeira página! Mas não me parece que, no Record, haja gente muito preocupada com isso.

7 comentários:

Nelson disse...

o argumento "diagonal" é relevante pelo seguinte: a estimativa à distância percorrida é feita tomando como ponto de referência ou o centro da baliza ou o primeiro poste; como a bola entrou ao segundo poste a distância terá sido maior. Mas, como eu disse, basta repetir a conta do Record (16,5 metros em 28 centésimos de segundo) para perceber que o valor está errado.

E sim, 200 km/h é uma barbaridade em futebol. Mesmo em ténis (com uma bola muito menor e muito mais leve) não são muitos os que conseguem atingir essas velocidades.

A mim parece-me que o Record estimou muito por baixo o tempo de voo da bola.

JSA disse...

Exacto nelson, o resultado daria, aritmética por aritmética, 212 km/h, mas enfim.

Os cálculos do tempo que a bola demorou a entrar na baliza são assim para o ridículos. Sem uma câmara de alta velocidade é difícil avaliar o intervalo de tempo em causa. 28 centésimos de segundo? Isso parece-me medido a dedo e, tal como toda a gente saberá, um desvio de nada coloca um erro brutal nessa medição (por alguma razão os records do mundo dos 100 metros só começaram a ir às centésimas com a chegada das medições electrónicas).

Em relação à força, mesmo que as bombas do Ronny sejam mais rápidas que as do Roberto Carlos, atirar daquela forma, para cima, é mais fácil que manter a bola quase paralela ao chão como fazem os verdadeiros especialistas. É que o movimento do pé já é no mesmo sentido ascendente (diagonal, digamos) e portanto, para manter a mesma velocidade, a energia necessária é menor. Por outro lado, o facto de a bola manter uma trajectória ascendente evita as turbulências ao nível do relvado a que as bolas mais próximas do solo estão sujeitas. Ou seja, esse tipo de tiro está energeticamente mais optimizado.

Porque razão não é usado então? É simples: porque basta um errozinho de um grau que seja no pontapé para a bola ir parar às nuvens...

Nelson disse...

o tempo? Bem, 28 centésimos de segundo são exactamente 7 frames no sinal de televisão normal (25 fps). Como terão eles analisado as frames? Foi com apenas uma câmara (e dava para ver ambos os instantes com clareza, tendo em conta os ângulos) ou foi com duas câmaras (e lá se foi a sincronização)?

Com um erro de 4 frames (duas em cada instante) o tempo passa de repente para 135 km/h. Mais razoável. Enfim...

Filipe Moura disse...

Dois lampiões de Leiria de que falam quando se encontram, mesmo que não se conheçam (que eu saiba)?

Obrigado a ambos pelos excelentes comentários. Só um reparo: a distância percorrida está subestimada. O valor real é superior ao utilizado, e por isso daria uma velocidade ainda maior. O problema é mesmo o do tempo!
Obrigado especialmente pelo teu último comentário, Nelson. Acho que o vou destacar.

João Gaspar disse...

embora tenha aprendido bastante com o post e consequentes comentários, era preferível que não tivesse sido golo!

AA disse...

Não só: Velocidade média ("distância percorrida" / "tempo que a bola demorou a chegar à baliza") é diferente de velocidade instantânea ("entrou a", "atingiu")... :)

Filipe Moura disse...

Olá António.
Num intervalo de tempo tão curto podes desprezar as forças de atrito.
Pelo teorema de Lagrange, pelo menos em um instante a velocidade instantânea é igual à média. Como é um intervalo de tempo tão curto, a velocidade praticamente não varia.