«A Inglaterra caiu pela quinta vez consecutiva num desempate por penalties, depois de confirmar que toda a sua arrogância era puro marketing— como tantas coisas outras entre as vedetas inglesas e as suas insuportáveis wags. Restaram, pois (alguém tinha de restar...), a Alemanha, após um jogo mortal de chatice contra a Argentina, e a Itália, em mais uma exemplar demonstração de cinismo. E a França, essa sim, a excepção à regra geral e ao que até aí tinha feito. Em minha opinião, a França fez contra o Brasil o melhor jogo de um candidato ao título que eu vi neste Mundial. Pouco importa se foi uma ressurreição fugaz (mas já ensaiada contra a Espanha) ou um assomo de categoria e orgulho ferido de uma Selecção a quem já haviam feito o obituário. O que sei é que— e muito embora, o meu coração, como o de quase todos os portugueses torcesse pelo Brasil— não tardei a mudar de campo, assim que comecei a ver a displicência estéril do futebol brasileiro face à vontade e superior categoria dos franceses. Ronaldinho estreava a sua nova bandelette e havia, nos meninos de ouro do Brasil, muita preocupação com os penteados, a amarração dos cabelos, as tatuagens e a cor das botas— toda essa parafernália de acessórios que caracteriza as vedetas futebolísticas de hoje. E foi então que, lá do Purgatório onde o imaginavam em definitivo repouso, emergiu Zinedine Zidane— sem tatuagens, nem bandelette, nem sequer cabelo— para assinar com caneta de ouro o livro de memórias que ficará deste Mundial e resgatar, mesmo antes de dizer adeus aos estádios, a honra e o fascínio do futebol.»
Miguel Sousa Tavares, A Bola
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