O assunto pelos vistos – e pela repercussão que teve – é delicado. Vamos ver se a gente se entende: eu nunca disse (e nem o penso) que “provinciano é tudo o que é de fora de Lisboa”. Disse que a praxe era um costume provinciano, e afirmei que a praxe, pelo menos em Lisboa (que é onde eu conheço melhor o meio académico) é trazida pelos alunos de fora de Lisboa. Não conheço nenhum aluno de Lisboa, a estudar em Lisboa, que seja favorável à praxe. Todos os casos que eu conheço de alunos favoráveis à praxe, em Lisboa, são alunos deslocados. E isto já resulta de vários anos de observação, como aluno e docente. Admiti as limitações da minha amostra – precisava de saber, por exemplo, se há alunos naturais de Lisboa noutras cidades favoráveis à praxe. Mas estou ainda assim convencido de que a praxe não é um hábito de Lisboa. Foi (tristemente) importado pelos alunos de fora que Lisboa recebe.
Daí a concluir que não há provincianos em Lisboa (como se a praxe fosse o único critério para avaliar o “provincianismo”) ou que tudo o que vem de fora de Lisboa é provinciano é um abuso. Não escrevi nada disso, como se pode confirmar. Tais interpretações constituem mais uma manifestação de um complexo de perseguição da parte de quem não é de Lisboa.
É possível que eu não conheça bem o Minho, mas conheço muito bem Lisboa e, particularmente, o Instituto Superior Técnico. Não tem por isso razão nenhuma o Pedro Morgado quando fala nas “afamadas praxes” do Instituto Superior Técnico. Tais praxes, contra as quais me insurgi neste blogue, são um fenómeno recente. A verdadeira “tradição académica” do Técnico sempre foi não ter tradição académica nenhuma (e em particular não utilizar “traje académico”). Se a praxe ressurgiu no Técnico nos anos recentes foi uma evolução lamentável, e foi trazida de fora. O mesmo se pode dizer, aliás, das faculdades tradicionais de Lisboa. A praxe (e a “tradição académica”) em Lisboa viam-se nas “universidades” como a em que o nosso primeiro ministro obteve a sua licenciatura: era a maneira que elas tinham de parecerem universidades a sério. Se há um ressurgimento destas práticas no ensino superior público (que traduz um sentimento elitista de que quem anda na universidade é um “privilegiado”), tal deve-se a serem cada vez menos – e ainda bem - essas universidades “de vão de escada”. Há que dizer que este tipo de comportamentos não são admissíveis em universidades de qualidade. Entretanto creio que nas universidades tradicionais só em Lisboa esta noção foi adquirida. Por isso mantenho que se há praxe em Lisboa, foi trazida de fora. Ainda não vi nada que mostrasse que estou errado.
2007/11/06
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15 comentários:
Caro Filipe,
Se ler o que escrevi sobre os incidentes de Braga depressa percebe que temos uma visão comum sobre as praxes. O que contesto é a ideia que transmite de que "todos os males do país" chegam a Lisboa vindos da província.
Também eu sou um estudante de Braga que escolheu estudar na Universidade do Minho. E também por aqui há muitos que, como eu, não se "emanciparam" da casa dos pais por altura do ingresso ensino superior. E receber estudantes de outras paragens também não é um exclusivo da capital.
A sua conclusão (de que praxe chegou a Lisboa da provincia) é um equívoco. O facto do fenómeno da praxe ter surgido primeiro na "provincía" e só depois em Lisboa não é justificativo bastante para a relação de causalidade que enuncia.
Ainda ontem falava com um conterrâneo seu que me dizia que Braga era província porque não tem oferta cultural. O espasmo anti-provinciano lisboeta não é, portanto, um exclusivo seu.
«A sua conclusão (de que praxe chegou a Lisboa da provincia) é um equívoco. O facto do fenómeno da praxe ter surgido primeiro na "provincía" e só depois em Lisboa não é justificativo bastante para a relação de causalidade que enuncia»
A mim parece-me absolutamente suficiente. A praxe não nasceu em Lisboa de geração espontânea. Basta conhecer a história da praxe para o compreender. A praxe é adoptada pelas universidades de Lisboa por uma questão de moda, porque era giro. Confesso que quando eu era estudante não conheci uma pessoa sequer que, estudando em Lisboa, seguisse a praxe. A minha amostra era, evidentemente, menor, mas ainda assim sintomático. Noutras universidades (nem é preciso falar de Coimbra) isso seria simples. Em Lisboa nem por isso.
Quanto ao resto, essa interpretação abusiva que leva ao «"todos os males do país" chegam a Lisboa vindos da província» que parece que lêem nos textos do Filipe, é absolutamente desnecessária. O raciocínio parece-me, pelo menos com este post, claro: a praxe é um costume provinciano que não nasceu em Lisboa e que, portanto, chegou vinda da província. Não vejo qualquer problema neste raciocínio, especialmente quando eu sou de Leiria e estudei na Universidade com a tradição académica original. Não vejo a comichão que esta lógica causa a outros.
Caro Pedro (por favor trata-me por tu): eu nunca disse que todos os males do país vêm da província. Os regionalistas é que dizem que todos os males do país vêm de Lisboa, OK?
Eu nunca - nunca! - falei em "província". Falei na praxe como hábito provinciano (no sentido habitual da palavra provinciano), que surgiu fora de Lisboa (repito - nunca falei em "província") - e foi para cá trazida. Onde é que a minha conclusão é um equívoco? Tu é que ocorres numa contradição num comentário tão curto!
Finalmente, eu nunca disse que Braga era província e nem me referi à sua oferta cultural. Tenho pena desse lisboeta que referes (quem te diz a ti que eu sou de Lisboa?), pois é um inadaptado. Ires buscar esse exemplo, que não tem nada a ver com o que eu disse, desculpa-me mas revela um complexo de perseguição.
"Eu nunca - nunca! - falei em "província"." -- Filipe Moura (agora)
"A praxe é, porventura, a única socialização possível. Mas não deixa de ser um hábito humilhante e – mantenho – provinciano" -- Filipe Moura (antes)
- Se isto não é usar a palavra "provinciano" com um sentido pejorativo...
"Os meus leitores de fora de Lisboa que são contra a praxe que me desculpem o “província”" -- Filipe Moura (antes)
"Daí o referido (e eloquente) “querer trazer” a praxe da província para Lisboa" -- Filipe Moura (antes)
- Se a palavra "província" não tinha sido usada em tom pejorativo, para quê o pedido de desculpas?
Filipe, lamento mas não podes chamar os outros “provincianos” e depois acusá-los (a todos!) de complexos de perseguição. Se não querias usar as palavras “provinciano” e “província” em tom pejorativo, como usaste, então reconhece que te expressaste mal e não negues o óbvio e não passes a vida a dizer que os outros têm complexos de perseguição e de inveja dos lisboetas (já agora, inveja de quê?).
Repito, é tão simples como isto, se não querias chamar “provincianos” aos não-lisboetas e não pretendias que esta palavra (e derivados) fosse entendida em sentido pejorativo, então reconhece que te expressaste mal e ninguém te chateará mais.
Até agora a tua única resposta a quem, legitimamente, reage aos teus insultos foi o de de insultares ainda mais chamando-os complexados e invejosos.
"Até agora a tua única resposta a quem, legitimamente, reage aos teus insultos foi o de de insultares ainda mais chamando-os complexados e invejosos."
Ah, e obviamente que me estou a referir aos outros leitores. No meu caso podes insultar à vontade, que quem abriu as hostilidades fui eu.
Luís, no texto original fiz uma ressalva que tu só agora transcreveste e mesmo assim parece que te recusas a ler. Agora, se me dás licença hoje tenho mais o que fazer...
aaaiii... por onde é que começo?
vejamos, quanto a:
"Tem graça: ninguém se declara a favor da praxe, tirando os anónimos do texto original",
olhe eu declaro-me cem por cento a favor da praxe e quanto mais dela conheço menos compreendo determinados movimentos que por aí andam como MATA's ou assim. e Menos ainda compreendo quem ataca a praxe de Coimbra, principalmente quem a não conhece ou viveu! Em Coimbra o caloiro não é palhaço! Por isso todos os argumentos de que a praxe só serve para humilhar o caloiro e divertir alguns doutores não têm simplesmente fundamento (que outras províncias (como Lisboa) desrespeitem algo de bases intrincadamente enlaçadas com séculos de História de Portugal, isso é outra história e é mais exemplo do empobrecimento racional da juventude destes dias que outra coisa). Em Coimbra a praxe não se limita à semana de recepção ao caloiro!!!
É certo que aquando do gozo do caloiro (apenas uma de entre muitas componentes da praxe, em Coimbra) acontecem por vezes excessos; excessos estes que são cometidos por gente menos elucidada quanto à praxe e sinceramente não conheço nenhum outro local, com algum outro código da Praxe onde os caloiros (e não só) estejam melhor protegidos contra estes excessos.
Acerca do traje ser um objecto de luxo... simplesmente... não! Aliás sê-lo-á talvez para aquelas pessoas que o compram só para usar na bênção das fitas/pastas e tirar umas fotografias bonitas com a família. Para mim foi o dinheiro mais bem gasto que alguma vez gastei, pois não há par de calças da Salsa que use tanto sem estragar. Ora pense comigo meu caro: paguei 150 euros, mais coisa menos coisa, pelo respectivo. Usá-lo-ei durante Seis anos, 24 estações, tenhamos presente que o traje como está concebido tanto dá para o Verão como para o Inverno (que jeito não dá a bela capa nas noites frias do parque), e supúnhamos que comprávamos por estação apenas uma pecita de roupa, ora uns calções curtinhos ora um casaco mais forte; uma pecita de roupa que (estamos a comprar muuuuuito barato) nos ficava em 10 euros. Já gastávamos 240 euros... mais que 150 e como a roupa está mais cara que os dez euros por peça...
Mas deixe que lhe diga, o Traje está muito acima de conversas acerca de cifrões. Tem, com efeito, ainda! o intuito de nos igualar a todos. Quando vestimos o traje somos todos estudantes da mesma academia, qualquer que seja a nossa província de origem, curso, posses... naquele momento somos todos declaradamente orgulhos estudantes da Academia. Orgulhos porque batalhámos muito para lá chegar, orgulhosos por pertencermos à grande família Capas Negras, Família com uma História grande e valerosa e onde podemos sempre encontrar aconchego.
Sou uma provinciana perdida por Coimbra há apenas um ano e bastaram-me seis meses (e uma queima) para que Coimbra conquistasse definitivamente o seu espaço em mim, e se assim foi, foi graças à Praxe foi graças ao conjunto de usos e costumes tradicionalmente existentes entre os estudantes da Universidade de Coimbra e os que forem decretados pelo Conselho de Veteranos da Universidade de Coimbra; Usos e Costumes que são muito mais que gozar um caloiro! São: oferecer a esse mesmo caloiro um ombro amigo para chorar se for preciso; não aplaudir a serenata e saber porquê, atravessar a porta férrea de capa aos ombros...
Sinceramente já não estou indignada com o que li e com as críticas injustas que foram feitas, muito menos por ser uma provinciana parva só porque não partilho da opinião do nosso colega quanto à praxe, ou não habitar na elitista Lisboa, neste momento tenho pena que não possa sentir a grandiosidade da Praxe!
(se calhar comentei no sitio errado... apague o coment a mais pls :p)
" Agora, se me dás licença hoje tenho mais o que fazer..." -- Filipe Moura
Olha, fazes tu muito bem.
Primeiro dizes que o que não é de Lisboa é provinciano, depois usas o termo com um sentido pejorativo, depois, quando os ofendidos reagem e te respondem à letra, dizendo que tu é que és provinciano, dizes que não disseste o que disseste e acrescentas que tamanhas incompreensões só podem ser resultado de invejas e complexos anti-lisboetas, finalmente, quando te apontam as contradições óbvias dos teus escritos, metes o rabo entre as pernas e retiras-te.
Ás vezes é preciso fazer um desenho para as pessoas perceberem. Ver aqui.
Que as implicações não são equivalências também é coisa difícil de entender a quem nunca exercitou o cérebro com a lógica matemática...
Ai que paciência, Homoclínica! Não adianta...
De uma vez por todas. "Provinciano" é pejorativo. Eu, que não gosto da praxe, disse que ela era "provinciana". Além disso, e independentemente, observei que a praxe era trazida pelos alunos de fora. Propus que fosse típica de alunos deslocados (justamente por me recusar a admitir que as pessoas de Lisboa sejam de alguma forma "superiores", e por conhecer alunos do Porto, não deslocados, contra a praxe). Não o podia confirmar, por não conhecer alunos lisboetas deslocados. Mas afirmei o que é verdade (com uma boa amostra): que não conheço nenhum lisboeta a favor da praxe. Mas afirmei que a praxe não é nenhum "teste definitivo" de provincianismo. Pelos vistos o LA-C é que a vê assim. Deixá-lo estar que já dei muito para este peditório.
"Mas afirmei que a praxe não é nenhum "teste definitivo" de provincianismo." -- Filipe Moura
Meu querido Filipe Moura, tu desmentes-te a ti próprio, ou não foste tu que disseste que "uma boa definição de 'provincianismo' é ser a favor da praxe"?
É extraordinário como passas a vida a dizer que não disseste o que disseste. Tu és assim a respeito de qualquer assunto, ou é só quando falas de provincianismos e praxes?
Meu querido Luís, já te expliquei muitas vezes que uma implicação não é o mesmo que uma equivalência. Ser a favor das praxes é provinciano, mas ser provinciano não implica ser a favor das praxes. Há muitas outras maneiras de ser provinciano. Extrapolar para fora do contexto das praxes tudo o que eu disse só a propósito destas não tem cabimento. Tu és assim a respeito de qualquer assunto, ou só quando se fala de implicações e equivalências?
"Tu és assim a respeito de qualquer assunto, ou só quando se fala de implicações e equivalências?"
Apenas contigo, quando dizes que não disseste o que disseste.
Caro Filipe Moura.
A praxe nasceu em Coimbra. E de Coimbra foi exportada para todas as outras universidades.
Por exemplo, no caso do Porto, foi trazida pelos estudantes de Coimbra que faziam a primeira parte do curso em Coimbra e o fim no Porto. E com a abertura de novas universidades seguiu para elas também. E também a Lisboa chegou a praxe, que já a tem há várias décadas.
Ora, comete um equívoco ao arrogar uma superioridade moral das universidades lisboetas, em que todo o mal veio importado pelos alunos de fora de Lisboa. Ora, todas as outras universidades do país (excepto coimbra) poderiam dizer o mesmo.
Daí que, perdoe-me a afronta, mas o provincianismo* está todo do seu lado. A sua capacidade de percepção da realidade parece terminar com as fronteiras do distrito de Lisboa.
*O provincianismo trata-se de uma percepção da realidade quase exclusivamente centrada numa estreita relação de proximidade. Tudo é apreciado mediante a valoração apriorística que se tem do que está mais perto - os problemas do mundo reconduzem-se às questões da minha "aldeia" e as múltiplas contrariedades do nosso tempo serão, no fundo, as vicissitudes que acontecem na "minha rua"."
Apenas uma correcção ao meu anterior comentário: é que a universidade foi inicialmente fundada em Lisboa, e só depois foi para Coimbra.
http://pt.wikipedia.org/wiki/Universidade_de_Coimbra
Logo, provavelmente a praxe foi criada em Lisboa, daí exportada para Coimbra, e dalí para todo o país.
Logo, ups..., mas a praxe, essa coisa "provinciana" importada da "província" terá nascido precisamente na mais provinciana das cidades portuguesas - Lisboa.
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