2010/11/25

Elementos para a compreensão do 25 de Novembro

Excelente artigo publicado no Público há um ano atrás.

Contagem decrescente para uma guerra civil


Foram 20 dias alucinantes. O Governo mandou bombardear a Rádio Renascença. Os trabalhadores da construção civil sequestraram o Governo e a Assembleia. O Governo entrou em greve. Os líderes do PS, PSD e CDS fugiram para o Porto, porque ia ser criada a Comuna de Lisboa independente. Os pára-quedistas ocuparam as bases da Força Aérea. A guerra civil ia começar. A reconstituição hoje possível do 25 de Novembro de 1975, a partir de entrevistas com os principais intervenientes e dos livros que, para deixarem o seu testemunho para a História, alguns deles têm publicado. Por Paulo Moura

2010/11/16

Chegando a Vias de Facto

O meu texto Semântica no Trabalho originou uma discussão interessante no Vias de Facto, que eu vou tentar abordar de forma sintética. A minha ideia era contrapor, ou mesmo refutar, uma tese do Miguel Madeira que me pareceu simplista. Não era apresentar uma tese nova, alternativa. O Miguel Madeira agarrou-se a uma tese que ele pelos vistos julga que eu defendi. Mas não o vi em lado nenhum defender a sua tese inicial, que eu critiquei. Nos comentários ao texto do Miguel, Manuel Resende, tradutor e cultivador de cenouras que eu tive o prazer de conhecer no salão nobre do Hotel de Ville de Paris aqui há uns anos, perora sobre um futuro tecnológico onde desaparecerão os trabalhos desagradáveis como limpar as retretes. Intuo do texto do Manuel que não sou o único a urinar no pomar (no meu caso, da minha avó), mas para um pomar é uma coisa; para cima das cenouras (ou da salsa) é outra. (Eu sei, é o que fazem os animais selvagens, mas adiante.) E defecar, então, nem pensar (eu é que não queria andar num pomar com esse tipo de adubo não compostado). Isto é para dizer ao Manuel que podemos ser muito tecnológicos e dar excelentes aplicações aos nossos detritos: acho tudo isso ótimo. Mas enquanto não descobrirmos alternativas precisaremos sempre de retretes nas nossas casas e teremos que as limpar. O resto é ficção científica, género que nunca me agradou. O cervejista Miguel Serras Pereira (este meu texto é tão palavroso e tem tantos links que até parece um dos dele) pega no comentário do Manuel Resende, num texto onde conclui várias coisas. Conclui (bem) que "a interiorização" de uma moral "seria o perfeito oposto da autonomia quer no plano colectivo, quer no da esfera individual" (as minhas objeções à autonomia irrestrita passam por aqui). E conclui (e eu discordo) que o comunismo "só é concebível em condições de abundância e disponibilidade de recursos rigorosamente ilimitadas". Pelo contrário, eu diria isso do autonomismo: só funcionaria em comunidades muito mais pequenas, com populações que não fossem forçadas a conviver e partilhar recursos quotidianamente, isto é, se houvesse muito menos população e menor consumo de recursos. Disso mesmo se parece ter apercebido o Pedro Viana, que conclui que é necessário "educar para a autonomia e a frugalidade, o que é incompatível com a promoção da dependência e alienação nas actuais sociedades centradas no consumo", mas desde que exista um estado social que "assegure os mínimos". Ora se os mínimos têm de ser assegurados pelo estado é porque dele dependemos, não é? A autonomia e a independência morrem aqui. Por outro lado, concordo inteiramente com o Pedro ser necessário educar ("interiorizar uma moral", diria o Miguel Serras Pereira) para a frugalidade - escrevi isso aqui. A proibição total de publicidade é uma ideia gira, embora algo radical: o que pensaria dela o Luís Rainha? Não consigo discutir com Zé Neves nem com alguém que chame "formulação cretina" à designação "esquerda cervejista". Não por me chamar cretino a mim; com insultos posso eu bem. Mas por chamar cretino ao Odorico Paraguaçu. Não consigo discutir com quem chama cretino ao Odorico: são demasiadas divergências ideológicas.

Uma sugestão aos autonomistas

Na terça feira, enquanto estava encalhado no comboio em Vila Nova de Gaia, fui avançando na leitura do Guerra e Paz. (Na verdade eu li foi durante a viagem. Enquanto o comboio esteve parado em Gaia, fazendo-me perder duas ligações, eu não consegui ler nada, stressado que estava a protestar por mais um suicida ter tido a desconsideração de se atirar à linha de comboio, prejudicando a vida de quem queria ir trabalhar, quando tinha o rio Douro ali mesmo ao lado.) A páginas tantas (530, para ser exato), cheguei à seguinte passagem, que aqui transcrevo:
"A tradição bíblica ensina-nos que a felicidade do primeiro homem antes da queda consistia na ausência de trabalho, isto é, na ociosidade. O gosto da ociosidade manteve-se no homem réprobo, mas a maldição divina continua a pesar sobre ele, não só por ser obrigado a ganhar o pão de cada dia com o suor do seu rosto, mas também porque a sua natureza moral o impede de encontrar satisfação na inactividade. Uma voz secreta diz ao homem que ele é culpado de se abandonar à preguiça. E, no entanto, se o homem pudesse achar um estado em que cumpria um dever, embora inactivo, esse estado viria a encontrar uma das condições da sua felicidade primitiva. Esta condição de ociosidade imposta e não censurável é aquela em que vive toda uma classe social, a dos militares. Em tal ociosidade está e estará o principal atractivo do serviço militar."
Guerra e Paz é uma obra fundamental e Tolstoi é mesmo um génio, pois descobriu o que deveriam os autonomistas fazer: talvez devessem era ir todos para a tropa.

2010/11/15

Sem ajudas

Ganhasse Webber ou Vettel, seria sempre a vitória da competição aberta contra o jogo de equipa. (Se ganhasse Alonso, a hipótese que eu menos queria, seria exatamente ao contrário.) Para a Ferrari foi uma derrota estrondosa: os resultados arranjados não disfarçaram enormes deficiências. Para a Fórmula 1 julgo que a vitória de Vettel é boa, como é bom que mais uma vez o campeonato só se tenha decidido na última corrida, e desta vez, algo inédito, com quatro potenciais vencedores. Parabéns à Red Bull e ao mais jovem campeão de sempre.

2010/11/02

A minha viagem de comboio

O comboio em que seguia ficou parado na Linha do Norte, em Gaia. Aparentemente mais uma pessoa se atirou à linha. Mais um suicida que não sabe tomar comprimidos, ou que decidiu desforrar-se do mundo atrapalhando a vida a uma série de cidadãos inocentes, atirando-se à linha quando tinha bem perto todo o rio Douro à sua disposição. Mas será que até no suicídio não temos consideração pelos outros? Um alemão ou um holandês de certeza que não se suicidariam assim - teriam mais consideração pelo próximo. Em lugar de atrasarem a vida dos seus concidadãos, certamente escolheriam um processo que envolvesse menos danos. Sempre seria melhor que andar a atrasar a vida a uma série de cidadãos inocentes, atirando-se às linhas de comboio ou de metro. Pensando só agora no comboio, poder-se-iam instalar vigias de forma a que as pessoas não se aproximassem das linhas.

Adenda: parece que afinal foi só um homem que decidiu atravessar a linha do comboio de qualquer maneira. Passámos por ele, após estarmos parados quase uma hora e eu ter perdido dois comboios. Estava a ser reanimado. Ainda bem. Espero que, quando finalmente o reanimarem, lhe dêem uma carga de porrada.